segunda-feira, 12 de abril de 2010

A China vai desacelerar na próxima década

11 de abril de 2010 | 0h 00
Cláudia Trevisan - O Estado de S.Paulo

O ritmo de crescimento da China vai desacelerar acentuadamente em algum momento da próxima década, o que levará à queda do preço das commodities, prevê o americano Michael Pettis, professor de Finanças Internacionais da Universidade de Pequim. Nesta semana, Pettis estará em São Paulo, a convite do Banco Itaú, para falar das perspectivas daquela que será a segunda maior economia do mundo em 2010 e seu impacto na cotação das commodities. Para ele, a recente trégua no conflito entre EUA e China em torno do valor do yuan é temporária. A seguir, a entrevista concedida ao Estado.

Sobre o que o sr. vai falar no Brasil?

Sobre a China, sobre seu modelo de crescimento, por que acredito que haverá uma significativa redução do crescimento ao longo da próxima década e o que isso pode significar para o preço das commodities.

E qual é sua visão?

Um dos principais fatores que mantêm o preço das commodities em alta é a demanda chinesa. Mas isso é resultado de duas coisas: rápido crescimento na China e acúmulo de estoques. Há um significativo aumento de estoques de commodities na China, o que é preocupante. Significa que o preço está mais alto do que deveria e a eventual redução da demanda pode provocar queda de preços maior do que as pessoas esperam.

E quão próximos estamos desse cenário?

Difícil dizer. Você pode ter tanto crescimento quanto esteja disposto a "comprar". Você empresta e gasta o dinheiro em crescimento. Em 1987, quando houve o crash no mercado acionário americano, a economia japonesa deveria ter colapsado imediatamente. Mas isso não ocorreu porque o Japão, que já tinha o mais alto nível de investimento de qualquer país rico, aumentou de maneira significativa seus investimentos. Muitos desses investimentos foram mal utilizados, o que levou ao aumento dos créditos irrecuperáveis no sistema bancário. Isso durou dois anos. Aí começamos a ver o aumento da dívida do governo, enquanto limpava o sistema bancário. É quando entraram no período de baixo crescimento. A questão para a China é quando eles deixarão de ser capazes de aumentar investimentos para manter o crescimento alto. E uma questão importante é quanto desse investimento foi mal aplicado. Se houver muitos créditos irrecuperáveis, o custo de limpar o sistema bancário vai recair sobre as famílias, o que vai fazer com que seu consumo desacelere. Alguns dizem que todos são bons investimentos, outros que uma enorme quantidade é ruim. Minha estimativa é que a situação poderá se manter por pelo menos mais dois anos. Mas é claramente insustentável.

Como o sr. interpreta o adiamento do relatório do Tesouro dos EUA em relação ao yuan e as indicações da China de que pode mexer no câmbio?

É bom que tenha sido adiado, mas sou pessimista. É apenas temporário. A menos que você acredite que o desemprego nos EUA cairá rapidamente, esse problema não vai desaparecer. Do lado chinês, a habilidade para ajustar é muito restrita. Eles têm um problema sério e real e não serão capazes de ajustar rapidamente sem um enorme aumento do desemprego.

Por que a China resiste tanto em valorizar sua moeda?

A China tem poupança e superávit comercial altos porque as políticas industrial e cambial, a taxa de juros, a dificuldade dos trabalhadores de aumentar seus salários, todas essas coisas representam uma transferência de renda das famílias para o governo, o setor estatal, a infraestrutura, o setor exportador etc. Isso representa um grande subsídio e um enorme imposto sobre a renda das famílias. Todas essas coisas restringem o consumo e subsidiam a produção. A moeda depreciada também é um tributo velado. Ela reduz o consumo e beneficia o setor manufatureiro, que é capaz de produzir a baixo custo e vender a um preço mais alto no exterior por causa do câmbio. Como a China produz mais do que consome, tem de exportar a diferença e ter superávit comercial crescente. Para reverter isso, é necessário eliminar todos esses subsídios. Mas, se isso ocorrer, o setor manufatureiro vai à falência. Existe a percepção de que os fabricantes chineses são muito eficientes, mas não é verdade. Se o subsídio da taxa de juros for eliminado, o lucro de todo o setor estatal desaparece.

O presidente do Banco Central do Brasil, Henrique Meirelles, afirmou que o valor depreciado da moeda chinesa não é um grande problema para o Brasil. O sr. concorda?

No ano passado, a China ultrapassou os EUA como o maior mercado de exportações brasileiras. O que os EUA compram do Brasil? Principalmente bens industrializados. O que a China compra? Principalmente commodities. Sob essa perspectiva, se você não se importa com a composição das exportações brasileiras, a moeda depreciada não é um problema.

Nenhum comentário: